Qual o limite da obediência do cristão as leis e as autoridades?

 

E não sejais cúmplices nas obras infrutíferas das trevas; antes, porém, reprovai-as. (Efésios 5:11)

Como cristãos a Bíblia nos ensina que devemos obedecer e orar pelas autoridades constituídas (Rm 13:1-7) (1Tm 2:1-3), contudo, isso não nos impede nem nos isenta de criticar e apontar os desvios morais e de conduta dos mesmos como fizeram consciente e veementemente os profetas, apóstolos e próprio Senhor Jesus (Is 38:1) (Mt 3:7) (Mt 23:13-33) (Mc 6:17-20) (Lc 13:31-32) (At 5:17-29).

O cristão como cidadão do reino e conhecedor de suas obrigações como civil, deve ter uma postura pacífica e ordeira, entretanto, isso não significa ser passivo ou omisso diante dos abusos de autoridade cometidos por aqueles que deveriam ser os primeiros a zelar pela justiça – magistrados e autoridades constituídas.

Toda regra, lei ou ordem que contrarie gravemente a Palavra de Deus, deve ser prontamente rejeitada e combatida por todo aquele que não negligencia o peso e a responsabilidade do chamado profético a nós (Igreja de Jesus) outorgado (Ex 1:15-21) (Js 2:1-16) (1Rs 18:3,4,13) (Dn 3:1-18) (Dn 6:1-16) (At 4:8-19,29) (At 5:17-29).

Por contrariar a determinação das autoridades e da lei pregando o Evangelho, o apóstolo Paulo foi preso injustamente no templo (At 21:30-40) e poderia ter se submetido passivamente à eles acreditando que nada poderia ou deveria ser feito. No entanto, ele lutou pelos seus direitos apelando para sua cidadania romana, a fim de combater aquela arbitrariedade que estava sofrendo (At cap. 22-25).

A parcialidade judicial no A.T. foi tenazmente combatida pelos profetas, que ousadamente confrontavam sem medo reis e autoridades corruptas e desequilibradas, que atuavam de modo a levar vantagem desonestamente sobre o povo oprimindo-os de forma tirana e impiedosa (Ex 23:8) (Dt 16:18-20) (Sl 8:3) (Sl 82:2-5) (Is 5:23) (Is 10:1-4) (Mq 3:11) (Mq 7:3).

O servo de Deus Isaías constatou e registrou perplexo em suas profecias, os desvios morais e de conduta das autoridades constituídas do seu povo: “A justiça é posta de lado, e o direito é afastado. A verdade anda tropeçando no tribunal, e a honestidade não consegue chegar até lá. A verdade desapareceu, e os que procuram ser honestos são perseguidos” (Is 59:14,15).

Como cristãos devemos ser ativos na sociedade lutando contra todo tipo de injustiça, assim como fizeram aqueles que ao custo da própria vida não temeram as retaliações dos poderosos (Hb 11:32-37).

Não podemos nos conformar com a zona de conforto com medo de adentrar na arena do confronto.

Lamento que alguns não se posicionem por covardia, indiferença ou leniência. Lamento que alguns tenham a consciência tão rasa achando que não devem se envolver em questões que dizem respeito ao futuro da nossa nação e de sua própria família citando com ar de superioridade (2Tm 2:23) (Tt 3:9), mas desprezando todo o seu contexto e a vida de intenso combate pela justiça de quem escreveu estas mesmas palavras – Paulo apóstolo.

É bem verdade que a Bíblia nos orienta que devemos ser agentes pacificadores (Mt 5:9), e que devemos prezar pela paz quando “depender” de nós (Rm 12:18). Mas, a Palavra de Deus também nos afirma categoricamente que são “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça” (Mt 5:6), e isso não se resume simplesmente a uma questão espiritual/escatológica (Rm 1:18) (Cl 3:25) (Lv 19:15) (Dt 16:19) (Sl 5:4) (Pv 11:1) (Pv 17:15). Não existe paz possível quando o que se tolera é a injustiça e a impiedade (Jr 6:14) (Jr 8:11).

Portanto, o cristão que deseja ser coerente com sua fé não deve calar sua voz (Pv 31:8,9), pois como sal e luz devemos interferir na sociedade de maneira que ela seja mais justa e haja igualdade de direitos entre os cidadãos, e que os poderes executivo, legislativo e judiciário sejam os primeiros a darem o exemplo se desejam que não ocorram tumultos e tragédias por conta de sua falta de lisura e integridade na aplicação das leis.

Ademais, as manifestações e protestos de modo ordeiro e pacífico contra as injustiças e arbitrariedades daqueles que deveriam dar o exemplo, mas não dão, está previsto na nossa Constituição Federal Brasileira e na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Constituição Federal Brasileira

*Art. 5º, § IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; 

*Art. 5º, § XVI – todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente.”

*Art. 5º, § XVII – é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar.”

*Art. 220 da lei maior – A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

Declaração Universal dos Direitos Humanos:

*Art. 18 Todo o homem tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular.

*Art. 19: Todo o homem tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferências, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios, independentemente de fronteiras.

*Art. 20: Todo o homem tem direito à liberdade de reunião e associação pacíficas.

 

Espero que com esse estudo possa eu ter contribuído de alguma forma para que nós como Igreja venhamos de fato cumprir nosso papel na sociedade como agência do reino de Deus que influencia e transforma os ambientes e locais onde estamos inseridos.

Termino com as palavras de Pedro e os apóstolos em meio às perseguições políticas e religiosas que estavam sofrendo: “MAIS IMPORTA OBEDECER A DEUS DO QUE AOS HOMENS” (At 5:29).

 

Deus te abençoe,

Franklin Rosa